O Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa do Senado Federal publicou o Texto para Discussão nº 353, intitulado “Além da Doação: como a legislação brasileira de redução de perdas e desperdício de alimentos poderia impactar a segurança alimentar e nutricional e a saúde pública”, de autoria de Marcus Peixoto e Fabiana de Menezes Soares. O estudo analisa como a legislação brasileira sobre perdas e desperdício de alimentos (PDA) pode contribuir para a segurança alimentar e nutricional (SAN) e para a saúde pública, avaliando o atual marco legal e as propostas em tramitação no Congresso Nacional.
Legislação atual é insuficiente
A análise aponta que o Brasil ainda trata o combate ao desperdício como uma ação isolada, centrada na doação de alimentos prevista na Lei nº 14.016/2020, aprovada no início da pandemia de COVID-19.
Embora importante, a norma não aborda toda a cadeia produtiva, deixando de lado etapas essenciais como transporte, armazenamento, comercialização e consumo.
Em vez de uma política estruturada de combate às perdas e ao desperdício, o país tem apenas um marco legal emergencial, que não enfrenta as causas estruturais das perdas: a falta de infraestrutura e logística adequada; a ausência de dados e monitoramento; e a integração com políticas de segurança alimentar, saúde pública e meio ambiente.
Além disso, a lei não define responsabilidades claras entre produtores, comerciantes, transportadores e o poder público, o que dificulta a implementação efetiva e o controle sanitário das doações.O resultado é que o desperdício continua sendo tratado como caridade, e não como uma questão estratégica de segurança alimentar, justiça social e sustentabilidade ambiental.
Falta uma política nacional estruturada
O país ainda não possui uma política nacional integrada de combate às perdas e desperdício de alimentos. O Projeto de Lei nº 2.874/2019, aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em 2025, busca preencher essa lacuna ao instituir a Política Nacional de Combate à Perda e ao Desperdício de Alimentos (PNCPDA). A proposta define princípios, instrumentos e metas claras, além de integrar ações entre governo, setor privado e sociedade civil — alinhando o Brasil às metas da Agenda 2030 da ONU, especialmente ao ODS 12.3, que prevê a redução pela metade do desperdício global de alimentos até 2030.
Impactos ambientais e sociais
De acordo com dados citados pela FAO, 1,3 bilhão de toneladas de alimentos são perdidos ou desperdiçados todos os anos no mundo, respondendo por até 10% das emissões globais de gases de efeito estufa. No Brasil, o desperdício também agrava os impactos sociais, uma vez que milhões de pessoas ainda enfrentam insegurança alimentar enquanto alimentos aptos ao consumo são descartados.O estudo mostra que o desperdício também está ligado a hábitos alimentares ruins e ao consumo crescente de ultraprocessados. Esses padrões aumentam os casos de obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares, e ampliam as desigualdades alimentares.
Direito à alimentação e dignidade humana
Os autores reforçam que o combate ao desperdício é parte do direito humano à alimentação adequada, previsto na Constituição Federal. A professora Fabiana de Menezes Soares introduz o conceito de “indignidade alimentar”, segundo o qual desperdiçar alimentos significa negar dignidade e violar um direito fundamental.
Para saber mais acesse:
https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/td353