O que, efetivamente, é a intermediação financeira?

De fato, não há outra opção para o crescimento econômico, em bases sustentáveis, que não por meio da oferta adequada de crédito, em condições civilizadas. Não por outra razão, atribui-se grande importância à organização e ao funcionamento das instituições bancárias e do sistema de crédito, haja vista os papéis que ambos cumprem na intermediação financeira.

Os bancos e o sistema fazem a intermediação financeira quando logram transformar poupança em operações de crédito. São operações de crédito os capitais de dívida que se emitem, na economia, com a interveniência dos bancos e das demais instituições do sistema, a exemplo de empréstimos, financiamentos e instrumentos financeiros. Os capitais e a intermediação permitem que a poupança flua de quem a oferte para quem a demande, considerando o fato de que nem todo investimento pode ser realizado apenas com recursos poupados pelo próprio investidor.

Perceba-se, entretanto, que o verdadeiro “passe de mágica”não reside na intermediação financeira, propriamente dita. O “truque” está no regime bancário de reservas fracionárias, em função do qual os bancos multiplicam a quantidade de meios de pagamento, em circulação na economia, ampliando, por extensão, a quantidade de crédito que a economia pode ser capaz de movimentar.

É esse efeito multiplicador que, alavancando o crédito, contribui para expandir as atividades econômicas. Contribui para expandi-las, no presente, pelo lado da demanda, ao “aquecer” o consumo, assim como, pelo lado da oferta, ao franquear o investimento de recursos no aumento da capacidade produtiva.

Os meios de pagamento e o crédito são um múltiplo de grandezas como a poupança ou a quantidade de moeda emitida pelo Banco Central. Exatamente por isso, a propensão a poupar, as emissões de moeda, o nível de reservas bancárias, a regulação das atividades bancárias e a bancarização da economia contribuem para determinar não apenas o fator de multiplicação dos meios de pagamento, mas, também, a qualidade do crédito, em si mesmo. Entre os mais almejados atributos do crédito, figura o seu volume, que é definido pelas dimensões de quantidade, prazo e preço (juros).

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Por que o imposto sobre a renda não é, de fato, progressivo?

Embora a Constituição Federal exija que o imposto sobre a renda (IR) seja progressivo, ele, de fato, não é. Na verdade, trata-se de tributo agudamente regressivo, sendo sua progressividade mera ficção, a despeito de, nas leis ordinárias, prever-se que alíquotas nominais maiores correspondam a rendimentos também mais elevados.

Mas, por que o IR não é progressivo, a despeito da previsão de alíquotas crescentes, na medida em que os rendimentos sejam mais elevados?
 
A explicação reside no inadequado manejo do conceito de rendimentos tributáveis.
 
Falando rigorosamente, rendimentos tributáveis deveriam ser, jurídica e administrativamente, todos os rendimentos que, segundo a Constituição Federal, não pudessem ser tributados. E não podem ser tributados apenas os rendimentos imunes. São imunes somente os rendimentos assim considerados, no plano constitucional. Portanto, todos os demais rendimentos, inclusive os isentos e os beneficiados por regimes diferenciados de tributação, não se afiguram imunes. Por não serem imunes, integram ou deveriam integrar a categoria dos rendimentos tributáveis.
 
Isso, entretanto, não ocorre, na aplicação das normas tributárias. Ao que indicam as evidências, consideram-se “tributáveis” apenas os rendimentos que gerem créditos a serem pagos. Noutras palavras, estabelece-se uma indevida sinonímia entre rendimentos tributáveis, de um lado, e base de cálculo do IR, do outro.

Não por outra razão, haver a falsa impressão de que o IR seja progressivo. Falsa porque, na aferição da progressividade, é ignorada imensa parcela dos rendimentos efetivamente tributáveis, a exemplo dos que sejam isentos, como os provenientes de dividendos.

A amputação do conceito de rendimentos tributáveis permite não apenas que se manobre a tributação de maneira inconstitucional, fazendo do IR um tributo regressivo, mas, também, que se reforce o quadro de aguda concentração de renda e riqueza. Ao que se sabe, os contribuintes verdadeiramente abastados não vivem de rendimentos do trabalho assalariado, pesadamente tributado, mas, sim, de ganhos de capital, alvo preferencial de favores e benefícios fiscais.

Fernando Veiga Barros e Silva

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Privatizou, o consumidor paga a conta

A ideia é bem simples e não faz o menor sentido: o cidadão pagará, voluntariamente, pelos investimentos da empresa privada multinacional. Mas, detalhe: os lucros gerados por esse investimento NÃO SERÃO distribuídos a você, cidadão pagante.

A coisa é tão estapafúrdia e vergonhosa, que o prefeito “enfiou”, no enredo, essa história de que a tal “taxa” ou “contribuição” seria paga voluntariamente. Seria paga quando, se e no valor que o cidadão desejasse.

Você acredita nisso? Nem eu…

Mas, todas essas consequências já estavam previstas. Aberrações como essa decorrem da falsa noção, “vendida” ao cidadão comum, de que a empresa, em mãos privadas, tenha o “dom da multiplicação”. Não apenas não tem, como também é muito mais difícil, para uma empresa privatizada, manter o nível da provisão de utilidade pública ao consumidor e à sociedade.

A razão dessa dificuldade é muito simples: há forte concurso pelos recursos da empresa. De um lado, concorrem o mercado consumidor, a sociedade e os investimentos requeridos, como esse de enterrar os fios da rede de energia. Do outro lado, há os detentores do capital societário, os acionistas, os investidores de risco. E a empresa privatizada não tem o propósito de agregar valor e entregá-lo à sociedade. Ele agrega esse valor e apropria-se dele, em caráter privativo, tanto quanto puder. É de sua natureza agir assim. Esta é sua função básica: gerar valor para seus donos ou acionistas. Num jargão bem americanizado: “shareholders first”.

Por isso, agora pipocam críticas, na mídia, ao processo de privatização de empresas de energia. É marketing. É contenção de danos. As críticas são calculadas e buscam salvar as aparências do conceito geral de privatização, pois a ideia é continuar privatizando. Para tanto, prometem que, doravante, as empresas privatizadas estarão sujeitas a “servidões”. Não ficarão “soltas” para fazerem o que quiserem. Na verdade, a julgar pelo que ocorre em São Paulo, para não fazerem.

Essa aflição para vender empresas estatais deve sempre levantar questionamentos e suspeitas. De cara, porque a empresa estatal e o mercado em que ela opera são ativos valiosíssimos. E é nesse valor que os interessados estão de olho. Além disso, porque o intuito não é trabalhar para você. Com a privatização, a empresa e seu mercado viram um negócio como outro qualquer. A empresa privatizada passa a trabalhar de acordo com os interesses de seus novos donos. Você fica fora da equação.

Sendo assim, nada de tributar o consumidor. Os recursos para enterrar a rede de energia podem provir de aumento de capital. A concessionária pode lançar ações, visando financiar os correspondentes investimentos, assim remunerando os investidores e evitando repassar ao consumidor um ônus que nunca foi seu: o de arcar diretamente com os investimentos em infraestrutura de distribuição de energia.

Fernando Veiga Barros e Silva

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