Por Fernando Veiga Barros
Consultor legislativo do Senado Federal

 

Em mais uma de suas elucidativas publicações, a Receita Federal do Brasil (RFB) apresenta os dados da arrecadação de variados tributos, agora relativos às pessoas jurídicas, com base na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE). O último ano dessa série de dados diz respeito a 2018 e pode ser encontrado no sítio da RFB, na internet, em Dados, Informações e Gráficos Setoriais das Pessoas Jurídicas – 2009 a 2018.

A base de dados é imensa. Por isso, escolhemos trabalhar com um grupo específico de empresas (pessoas jurídicas). Esse grupo é o dos bancos (comerciais, múltiplos com carteira comercial, múltiplos sem carteira comercial e de investimento), todos eles categorizados na divisão 64 da CNAE. Os dados divulgados pela RFB, infelizmente, não trazem informações detalhadas sobre os resultados realizados pelas pessoas jurídicas, apenas apresentando o que a própria RFB convenciona denominar Receita Bruta, lado aos dados da arrecadação tributária.

No caso dos bancos, na divisão 64 da CNAE, figuram 169 CNPJ’s. Reunidos, esses 169 bancos responderam por arrecadação, em 2018, a título do Imposto sobre a Renda das Pessoa Jurídicas (IRPJ), no valor de R$3,9 bilhões. Além disso, pagaram Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), também em 2018, de R$2,7 bilhões. Na soma de ambos os tributos (IRPJ + CSLL), responderam por arrecadação de R$6,6 bilhões.

Para entender o peso relativo dessa carga tributária, fomos atrás dos dados contábeis desses bancos, mais detalhados. Para isso, acessamos a base de dados IF.Data, do Banco Central do Brasil (BCB), e criamos um universo de instituições financeiras formado, tão-somente, pelos consolidados bancários B1 (bancos comerciais, bancos múltiplos com carteira comercial ou caixas econômicas) e B2 (bancos múltiplos sem carteira comercial, bancos de câmbio e bancos de investimento). Essa categorização nos rendeu 167 instituições financeiras individuais, contra as 169 da categorização adotada pela RFB, o que nos parece razoável diante da inexistência de perfeita comunicabilidade entre os critérios de classificação convencionados, de um lado, pelo BCB e, do outro, pela RFB.

O que observamos? Vamos aos nossos achados:

  • Como já dissemos, com fundamento nos dados da Receita Federal (RFB), a arrecadação combinada (IRPJ + CSLL) é de R$6,6 bilhões, para um conjunto de 169 bancos. Isso significa que, em média, os bancos respondem, individualmente, por R$39,1 milhões, para ambos os tributos – IRPJ e CSLL.
  • Qual foi o lucro declarado ao Banco Central (BCB) pelos 167 bancos categorizados como comerciais, múltiplos de todos os tipos, caixas econômicas, de câmbio e de investimento, classificados nos consolidados bancários B1 e B2? O lucro líquido, apurado pela legislação societária, foi de R$118,8 bilhões. Exatamente: R$118,8 bilhões!
  • De quanto foi a carga tributária suportada pelos bancos, na forma da alíquota efetiva de ambos os tributos – IRPJ e CSLL? Bem, se somarmos a arrecadação proporcionada por ambos os tributos (IRPJ + CSLL) e a compararmos com o lucro líquido societário ou comercial, a alíquota efetiva foi de 5,5%. Isto, mesmo: 5,5% para ambos os tributos, tomados combinadamente!

Conclusão: além de um Sistema Financeiro Nacional ineficiente, incapaz de intermediar o crédito em condições minimamente moderadas, imprescindíveis à expansão das atividades econômicas, o Brasil ainda estende ao conjunto de suas instituições financeiras, notadamente aos bancos, tratamento tributário que destoa da racionalidade e da razoabilidade. Evidentemente, afigura-se gigantesca a diferença entre os conceitos de lucro líquido societário ou comercial – o lucro que as próprias instituições calculam para que seja levado à distribuição entre seus sócios e acionistas – e o lucro real ou tributável – aquele que as mesmas instituições calculam para pagar os tributos devidos. Deduz-se, nesse contexto, que as agruras fiscais, a brutal concentração de renda e a manutenção desse estado de coisas interessam, e muito!, ao dito “mercado”. Mecanismos como o teto de gastos, que representam disciplina fiscal pela metade, em muito interessam aqueles cujas relações simbióticas, com o poder, fazem-se pela via de regimes tributários especiais, de benefícios e favores fiscais e dos ditos “gastos tributários”.

De qualquer forma, o tema merece investigação mais profunda e precisa. Por isso, você está convidado a verificar os números da RFB e do BCB, refazendo contas e tirando suas próprias conclusões.

Obrigado pela leitura. As críticas serão muito bem recebidas.